Com o argumento de que a Constituição “não se coloca como um obstáculo à Reforma da Previdência” mas exige, na verdade, “a Reforma para a conscientização de variados direitos”, o parecer do Relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Senador Tasso Jereissati, opinou pela constitucionalidade e pela admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição n. 6, de 2019.
Em atenção aos supostos princípios do equilíbrio financeiro e atuarial, da busca pelo pleno emprego, da prioridade absoluta da criança e do adolescente, o texto apresentado pela Câmara dos Deputados ao Senado Federal sofreu apenas pequenas supressões, justamente para que não tenha de retornar à apreciação da Casa de origem.
Efetivas (ou nem tanto) modificações foram o objetivo de PEC Paralela, para que a Câmara proceda apenas à análise desses pontos, sem que o texto “aprovado de comum acordo pelas Casas deixe de ser promulgado”, em alusão ao mesmo procedimento adotado na Reforma ocorrida em 2003 (Emenda Constitucional n. 41, cujas alterações mais expressivas foram inseridas na Emenda Constitucional n. 47/2005).
Em síntese, o Relatório propõe as supressões seguintes no texto da PEC 6/2019:
(i) o parágrafo único do artigo 203 da CR, inserido pelo artigo 1º da PEC 6/2019, que constitucionalizava regra paramétrica para definição da linha de pobreza necessária à percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC): renda per capita inferior a um quarto (1/4) de salário mínimo;
(ii) o 1º do artigo 21 da PEC 6/2019, que trazia possibilidade de aumento de idade mínima e tempo de contribuição a partir de 2020 para trabalhadores e servidores públicos já atualmente em exercício e cujas atividades são exercidas com efetiva exposição a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos;
(iii) a expressão “no âmbito da União” contida no §1º-B do artigo 149 da CR, inserido pelo artigo 1º da PEC 6/2019, que restringia ao âmbito federal a instituição de contribuições extraordinárias em caso de déficit atuarial (Estados, Distrito Federal e Municípios poderão agora fazê-lo);
(iv) a alínea “a” do inciso I do artigo 35 da PEC 6/2019, que revogava os § 18 e 21 do artigo 40, que preveem a base de cálculo da contribuição previdenciária paga por servidores aposentados e pensionistas (valor que supere o teto do regime geral, ou o dobro dele, se o inativo tiver doença incapacitante).
Por meio da PEC Paralela, foram inseridas as alterações minudenciadas a seguir:
(a) permissão para que Estados, Distrito Federal e Municípios adotem as regras do regime próprio de previdência dos servidores federais mediante aprovação de lei ordinária do respectivo Poder Executivo (se aprovado pelo Estado, valerá automaticamente para o Munícipio, que terá 1 ano para decidir em contrário);
(b) observância do piso de 1 salário mínimo para todos os pensionistas;
(c) garantia de cota dobrada de pensão para o dependente menor de 18 anos (20%); exemplo: mãe com 2 filhos menores, perceberá a cota familiar (50%), sua cota como dependente (10%) e cada filho (20%), totalizando 100% do benefício;
(d) manutenção de tempo mínimo de contribuição para trabalhadores do regime geral de 15 anos;
(e) aumento de 10% no valor da aposentadoria por incapacidade no caso de acidente;
(f) reabertura, por 6 (seis) meses, do prazo para opção pelo regime de previdência complementar para servidores públicos federais;
(g) cobrança de contribuições previdenciárias graduais do agronegócio exportador e de entidades filantrópicas de educação e de saúde (sem afetar Santas Casas e entidades de assistência)
(h) cobrança dos optantes pelo Simples a investirem em prevenção de acidentes e proteção do trabalhador contra agentes nocivos.
As mudanças adotadas na CCJ atingem de forma bastante semelhante os trabalhadores da iniciativa privada e os servidores públicos federais: há garantia de valor mínimo para pensão, de cota dobrada para menores, de aumento de benefício em caso de aposentadoria por incapacidade em decorrência de acidente para ambos os grupos. Aos trabalhadores ao menos foi resguardado menor tempo de contribuição para aposentadoria: 15 anos.
A desarrazoada contribuição extraordinária imposta aos servidores públicos foi mantida e ainda aberta a Estados, Distrito Federal e Municípios. Aliás, a categoria é mais uma vez criticada no texto apresentado por supostamente receber a maior, sem se levar em consideração que, igualmente, contribui com mais e por mais tempo. Defende-se justamente que é preciso “fortalecer as alíquotas” para os servidores, de forma a “evitar o confisco” sobre os contribuintes mais pobres.
O argumento dos supostos privilégios é mais uma vez indevidamente utilizado, da mesma forma como sequer são tratadas as violações aos princípios da vedação ao retrocesso social e da segurança jurídica, tidos apenas como mal-empregados na argumentação antirreforma.
Esperava-se ao menos uma justificativa melhor para subsidiar a PEC 6/2019 de uma Comissão voltada a analisar a constitucionalidade da medida. E foi justamente o que menos se fez: ignorou-se o texto constitucional em defesa – sequer comprovada – da redução dos gastos públicos.